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Já nada resta da Jerusalém salpicada de árvores, jardins floridos, sombras aprazíveis, tudo
estava decepado, queimado. Suspirei cansado, entrei na tenda, ajoelhei e tombei para cima
das almofadas espalhadas, afundei-me no sono. As muralhas tornaram-se na prisão dos
judeus e eu prisioneiro do meu sono, de sonhos tingidos de vermelho-sangue, de gritos que
saíam dos corpos magros de fome, de sede e de doenças mórbidas. Sonho com uma realidade
sonhada ou um sonho que é um pesadelo real. A cabeça anda às voltas e arrasta o
pensamento na mesma desordem. Estes distúrbios chegam sempre de noite como os ladrões.
No pesadelo ergo o gládio para duas vacas amarradas, de úberes inchados, espeto-lhes até
esguicharem leite e sangue para o meu rosto, lambo-os com igual prazer até perder o sentido
dos limites do que é humano e rio como um demente, corro pela cidade sem ruas nem
esquinas e grito: Sou o Alba Louco! Subo às casas que já não existem, assomo às janelas
escancaradas sobre o vazio cheio de horrores e sinto-me bem, vencedor, legionário, sou o
centurião Alba Louco! Olho a cidade esventrada, é um campo raso coberto por um manto
negro, compacto, cortado por nuvens de centelhas que esvoaçam ao sabor das labaredas que
enegrecem os escombros, destroços de vidas e entulho de habitações evisceradas. Pedaços
de corpos fumegam atolados numa massa sem cor, exalando um fedor açucarado de carne
humana ressequida, esturricada, preta. Quero saltar do pesadelo para um sonho normal e não
consigo. Quero acordar para outra realidade e ainda menos consigo. Onde está a estúpida da
seta que me atingirá, que me libertará destas evocações-pesadelos?